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“É preciso botar a anta na boca do povo”

 

Para salvar a anta, desmistificar os estereótipos em torno do animal e mobilizar a população para sua importância, Patrícia Medici não mede esforços. Há 30 anos, quando não se sabia nada sobre essa espécie, ela começou a estudá-la do zero. Hoje, Medici é a referência mundial na pesquisa e conservação da anta e vencedora dos principais prêmios internacionais da biodiversidade. Neste bate-papo, ela conta mais sobre essa história e os bastidores de “Anta – O Filme”, sua nova empreitada ao lado da Nitro e da Tocha Filmes. 

Patrícia Medici em Aquidauana (MS). Foto: João Marcos Rosa/NITRO

 

A anta é o maior mamífero terrestre da América do Sul; é considerada um fóssil vivo, por ter sobrevivido a diversas ondas de extinção; leva o apelido de “jardineira da floresta”, pela habilidade de dispersar sementes. Ainda assim, é uma espécie ameaçada e, no imaginário popular, é lembrada de forma pejorativa. Como “Anta – O filme” pode ajudar a quebrar esse estereótipo e contribuir com a sua preservação? 

Já tem muitos anos que dedicamos boa parte da nossa energia e do nosso tempo, como projeto de pesquisa e conservação da anta, para a comunicação. É preciso botar a anta na boca do povo, para que as pessoas conheçam esse bicho e saibam o quanto ele é inteligente e importante.

Usamos todos os veículos possíveis: internet, redes sociais, imprensa; participamos de eventos ligados à fotografia, à arte, exatamente por essa razão – precisamos, constantemente, desmistificar a conotação pejorativa da anta. Há um desconhecimento muito grande, sobretudo no Brasil, mas também no mundo sobre esse bicho. E as pessoas, como diz o jargão, só conservam o que elas conhecem.

Portanto, a nossa principal missão, na comunicação, é falar sobre a anta, usando todas as ferramentas e canais possíveis, para que as pessoas escutem, aprendam sobre o quanto ela é importante. Aprendam que não tem biodiversidade sem a anta, nem serviços ecossistêmicos como água, florestas, espécies vegetais.

O filme vai ser como uma injeção de conhecimento, vai mostrar a nossa paixão pela anta. Vai munir as pessoas de informação, instrumentalizando-as, para que possam se importar e ter vontade de agir pela conservação desse bicho.

 

“Anta – O filme” aborda o trabalho de 30 anos do INCAB (Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira), fala dos desafios da conservação, de problemas urgentes. Como está o andamento da produção, o que o público pode esperar e como contribuir – já que a meta de financiamento ainda não foi batida, certo?

Trabalhamos há alguns anos com o João Marcos Rosa, com a Paulina Chamorro, com a Nitro e a Tocha Filmes, particularmente no projeto Mulheres na Conservação – um projeto muito especial que trouxe oportunidades enormes de falar sobre a anta para públicos que não teríamos acesso.

Ao longo dessa história de trabalho em conjunto, pensando e conversando muito sobre comunicação (inclusive temos um curso de comunicação para conservação), surgiu a ideia do filme – que está na fase de captação de imagens. A equipe já esteve em Campo Grande (MS) e em três expedições de campo do INCAB, no Pantanal e em duas áreas de Amazônia. Em dezembro, partimos para a Mata Atlântica, depois Cerrado e finalizamos as filmagens na Caatinga.

Mais que abordar a causa da conservação da anta e contar a história desses 30 anos de trabalho do INCAB, o filme vai trazer um panorama sobre os biomas, vai ser uma viagem pelo Brasil, contada pelos nossos olhos: com múltiplas vertentes, para interessar e encantar as pessoas.

Realmente não atingimos a meta de financiamento coletivo, mas captamos recursos necessários para a pré-produção, o que foi muito importante. Agora, o filme foi aprovado pela Lei Rouanet e, em parceria com a Tocha Filmes, busca captar recursos por meio de incentivo fiscal. Estamos bastante confiantes: vamos conseguir esse dinheiro, finalizar o filme e lançá-lo em 2026, no Brasil e internacionalmente.

 

Você começou a estudar e monitorar a anta em 1996, ajudou a fundar o INCAB-IPÊ, criou o maior banco de dados do mundo sobre a anta brasileira. Como a sua história se misturou com a história da nossa “jardineira da floresta”?

Começamos de um jeito despretensioso: era um projeto para estudar um animal pouco conhecido, já que não se sabia nada sobre a anta, além do básico. Não pensávamos muito no futuro, se daria um mestrado, um doutorado, mas resolvemos colocar o dedo nessa ferida e iniciamos do zero. E fato é: quando você começa um projeto do zero e tem essa veia de pesquisador, uma curiosidade sobre as perguntas que o mundo natural nos traz, isso vira uma bola de neve – afinal, perguntas trazem mais perguntas.

E foi isso que aconteceu, as questões viraram um fascínio pela espécie e o reconhecimento de uma enorme oportunidade de pensar esse animal como ferramenta para responder questões ecológicas. Por exemplo, como se dá a dispersão de sementes? Como é ter um animal tão importante para a manutenção da biodiversidade? Como se dá o uso do espaço por esse bicho, porque ele é considerado um “engenheiro de ecossistemas” uma “espécie guarda-chuva”? Até onde vai a importância desse bicho, o que aconteceria se ele se extinguir, o que seria desses habitats?

Perguntas muito maiores, como essas, começaram a surgir e, junto, a vontade de respondê-las. Foi como uma avalanche fazendo a gente continuar. Da Mata Atlântica, expandimos para o Pantanal, Cerrado, Amazônia e, agora, estamos nos preparamos para começar na Caatinga. Levando sempre essas perguntas para cada um desses lugares: qual a importância da anta? Quais os riscos e consequências da sua extinção?

Posso dizer que esse foi um processo de transformação de um projeto em uma causa de vida. E foi tudo orgânico, natural, a consequência da curiosidade de responder essas perguntas, de abraçar uma causa, e querer salvar uma espécie tão importante para a humanidade.